Buscando o Autoconhecimento e o Autocontrole
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
Algumas técnicas especiais de Raja Ioga desenvolvem rapidamente os poderes superiores da alma humana.
 
Este tipo de estudo, no entanto, não pode ser empreendido na atmosfera magnética de uma civilização materialista. Desde uma perspectiva prática, nas nações dos tempos atuais ele é tão nocivo quanto desnecessário. Serve apenas para levar estudantes ingênuos à autoilusão e à derrota.
 
Quando abordada corretamente, a Raja Ioga está entre as fontes mais sagradas e mais elevadas do conhecimento universal, necessário para os peregrinos bem-intencionados. Raja Ioga é a ioga “real” ou suprema. Ela transcende as metas menores. Ela não inclui a ideia de um poder “pessoal”. As potencialidades psíquicas ou ocultas só podem ser corretamente desenvolvidas por aquele que transcendeu a vida individualizada, embora a preserve. Em meios teosóficos, a expressão “Raja Iogue” é com frequência usada como sinônimo de “Mahatma”.
 
Durante os primeiros anos do movimento teosófico, um discípulo leigo dos Mestres pensava que o movimento esotérico devia ajudar as pessoas a desenvolver poderes ocultos. Um Mestre de Sabedoria escreveu:
 
“Uma organização como [esta] (…) é impensável entre europeus, e torna-se quase impossível mesmo na Índia, a não ser que vocês estejam preparados para subir até uma altura de 6.000 a 6.700 metros em meio às geleiras dos Himalaias.”
 
Isto é, seria preciso viver entre os discípulos regulares dos Mahatmas, em locais secretos e afastados, para aprender alguns aspectos específicos de Raja Ioga. O estudo teria que ocorrer a uma distância segura do “zeitgeist”, do “espírito dos tempos”, do carma coletivo e da aura da ilusão materialista.
 
Em sua carta, escrita no final de 1880, o Mestre prossegue: 
 
“A maior e mais promissora destas escolas na Europa, o último esforço feito nesse sentido, fracassou claramente há cerca de vinte anos em Londres. Foi uma escola secreta para o ensinamento prático da magia, fundada com o nome de um clube, por uma dúzia de entusiastas sob a direção do pai de lorde Lytton. Ele reuniu com este objetivo os mais apaixonados e os mais empreendedores, assim como alguns dos mais adiantados conhecedores de mesmerismo e ‘magia cerimonial’, tais como Eliphas Levi, Regazzoni e o copta Zergvan-Bey. E, no entanto, na pestilenta atmosfera de Londres, o ‘Clube’ teve um final prematuro. Eu o visitei meia dúzia de vezes e percebi desde o princípio que nada poderia resultar dali. E esta é também a razão por que a S.T. britânica [1] não dá praticamente um só passo adiante. Seus membros pertencem à Fraternidade Universal, mas só de nome, e gravitam no melhor dos casos para o quietismo, uma paralisia completa da alma. São intensamente egoístas em suas aspirações e colherão apenas a recompensa de seu egoísmo.” [2]
 
Há várias razões pelas quais a Raja Ioga – vista como um processo técnico – é impossível de praticar em nossa civilização. Uma delas é indicada por Swami Vivekananda em seu livro “Raja Ioga”.
 
Vivekananda escreve:
 
“A castidade perfeita de pensamento, de palavras e de fatos impõe-se. Sem ela a prática da Raja Ioga é perigosa e pode conduzir à loucura.” [3]
 
Embora a exigência seja suficientemente difícil em civilizações materialistas, a regra da “absoluta castidade” em pensamento, palavra e ação não se refere apenas a sexo.
 
Castidade é pureza no ponto de vista adotado. Significa estar livre de toda parcialidade e de qualquer desejo pessoal cego. Uma tal independência em matéria de sentimentos é inseparável de uma rejeição firme e espontânea da possibilidade de olhar qualquer aspecto da realidade desde uma perspectiva egoísta – uma inclinação desprezível que leva à distorção da verdade.
 
Embora não ter uma vida pessoal no campo das emoções seja uma condição essencial para o desenvolvimento de poderes psíquicos, não é suficiente. A chamada “vida pura” no plano físico ocorre com frequência enquanto há egoísmo e orgulho pessoal, dois fatores que bloqueiam todo progresso no Caminho. O próprio mestre de Helena Blavatsky clarifica este ponto na bem conhecida Carta de Prayag. [4]
 
A busca de “poderes” deve ser desmascarada. 
 
No século 21, ou em qualquer outra época, uma meta pessoal na direção de “desenvolver poderes psíquicos” é egoísta e desprezível em si mesma. É também trivial e fútil. A verdadeira Raja Ioga não está limitada ao desenvolvimento de “poderes psíquicos” no sentido convencional da expressão. Longe disso. [5]
 
Cada peregrino em busca da verdade universal deve enfrentar a necessidade de autoconhecimento, de autocontrole, e de renúncia a ideias ilusórias sobre si mesmo e os outros. Compreender o processo de autoengano provoca uma alquimia gradual de libertação da ignorância, a partir do momento em que o indivíduo dedica sua vida inteira a uma meta transcendente e duradoura. 
 
Quem quiser aprender algo do ensinamento dos Mahatmas deve enfrentar os desafios probatórios que pertencem à Raja Ioga. Referindo-se a todo candidato ao discipulado, um Mestre de Sabedoria escreveu:
 
“O processo de testes – na Europa e na Índia – é o da Raja Ioga, e o seu resultado é, como tem sido explicado frequentemente, o desenvolvimento de todos os germes, bons e maus, que há nele e em seu temperamento. A regra é inflexível, e ninguém escapa, quer ele apenas escreva uma carta para nós, ou formule, na privacidade do seu próprio coração, um forte desejo de comunicação e conhecimento ocultos.” [6]
 
A Raja Ioga ensina o indivíduo a libertar-se da ignorância, da distorção da realidade, e da estreiteza mental. Ela desenvolve a liberdade interior e o discernimento necessários para trabalhar pelo bem de todos os seres. A verdadeira Ioga é aquilo pelo qual nos qualificamos para trabalhar com mais eficiência pelo bem da humanidade.
 
Ao ajudar o desenvolvimento de alma dos outros, beneficiamos a nós próprios.
 
Nas regras e regulamentos da Escola Esotérica que criou em 1888, Helena Blavatsky indica “Filosofia da Ioga, de Patañjali” como um dos quatro livros aos quais os estudantes deveriam dar “especial atenção”. Ela não mencionou nenhuma edição ou enfoque específico de Patañjali. [7]
 
Parece não haver um livro ou autor cujos escritos sejam suficientes para entender Raja Ioga desde uma perspectiva teosófica nas condições do século vinte e um. 
 
Cada estudante deve reunir por esforços independentes as partes dos ensinamentos de Raja Ioga que sejam mais úteis para si, nos livros disponíveis sobre esta ciência. As versões dos Ioga Sutras de Patañjali são numerosas, e elas transmitem lições de importância fundamental. Informação decisiva sobre Raja Ioga será encontrada nas Cartas dos Mahatmas e nos escritos de Helena Blavatsky.
 
Enquanto coletamos e estudamos os princípios mais úteis na realidade específica das nossas vidas, podemos interagir com estes ensinamentos de maneira forte e significativa. Deste modo criamos uma disciplina diária inteligente, flexível, capaz de durar por mais de uma encarnação.
 
NOTAS:
 
[1] S.T. – Sociedade Teosófica.
 
[2] Veja a Carta 11, páginas 75-76, volume I, de “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, Brasília, 2001. Em inglês, Carta 28, pp. 209-210, na edição de 1926 de “The Mahatma Letters”, publicada por T. Fisher Unwin Ltd., em Londres, Reino Unido, com 493 páginas e Index. O volume está disponível em PDF em nossos websites.
 
[3] Edição de 1925, 124 pp., ver p. 86, final do capítulo cinco. O livro está disponível em nossos websites. Clique para vê-lo: Raja Yoga ou Conquista da Natureza Interna”.  Em inglês, “Raja Yoga, Conquering the Internal Nature”, Swami Vivekananda, Advaita Ashram, Calcutta, India, 1996, 287 pp., p. 68.
 
[4] Clique para ver em nossos websites “Carta de Prayag – a Dimensão Sutil da Crença em Deus”.
 
[5] Em relação a poderes psíquicos, veja o artigo “Nem Tudo Que é Oculto é Espiritual”.
 
[6] “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, volume II, Carta 136, p. 316.  
 
[7] “Collected Writings”, Helena Blavatsky, TPH, EUA, 1980, volume XII, p. 497.
 
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O artigo “Bom Senso no Estudo de Raja Ioga” foi publicado em nossos websites associados dia 23 de janeiro de 2019.
 
Clique para ver os livros “Raja Yoga ou Conquista da Natureza Interna”, de Swami Vivekananda, e “Aforismos de Ioga, de Patañjali”, de William Q. Judge. Os Ioga Sutras têm outras boas versões publicadas em papel em português, preparadas por Yogue Ramacharaka, Rohit Mehta e I. K. Taimni, entre outros autores.
 
Uma das melhores versões da obra de Patañjali em inglês é “The Yoga-Sutra of Patanjali”, Translation, Introduction, Appendix and Notes by Manilal Nabhubhai Dvivedi, published by Tookaram Tatya, Bombay Theosophical Publication Fund, 1890. Elogiada por Helena Blavatsky, a obra de M. N. Dvivedi está disponível em PDF em nossos websites: clique aqui para vê-la.
 
 
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