Pomba Mundo
 
Uma Carta Sobre Renúncia e Concentração 
 
 
Robert Crosbie
 
 
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Afirma-se, sobre o caminho do verdadeiro Ocultismo, que “o primeiro passo é o sacrifício”. Isso significa “sacrifício” desde o ponto de vista mundano – o ponto de vista do qual nós começamos. O fato de que nós nos libertamos com alegria do peso de coisas indesejáveis mostra o funcionamento do verdadeiro eu.
 
Não tema o oceano da Vida: ele o apoiará. Eu frequentemente penso na passagem que diz: “Todas as coisas trabalham em conjunto pelo bem daquele que ama o Senhor”. Sua compreensão deste ditado será mais ampla que a comum.
 
Você fala de um sentido da verdade que é mais seguro do que qualquer forma de raciocínio. Esta é a ação de Buddhi – a cognição direta – a meta de toda filosofia correta e de toda vida correta. Em nossos esforços sinceros, nós às vezes podemos ter vislumbres deste nível de consciência. O grande resultado seria ter a contínua cooperação de Manas e Buddhi – a mente superior e o conhecimento espiritual; trabalhar como o homem divino, perfeito em todas as suas partes, ao invés da operação fragmentada que se obtém atualmente.
 
Você talvez se lembre de que no livro “A Voz do Silêncio” são mencionadas duas doutrinas. A Doutrina do Olho é a consciência cerebral, composta em grande parte de impressões externas. A Doutrina do Coração é a consciência espiritual do Eu Superior. Ela não é percebida pela consciência cerebral enquanto o pensamento correto e a ação correta – que mais cedo ou mais tarde acompanha o pensamento correto – não entram em sintonia com certos centros no cérebro cujo funcionamento se dá em unidade com a vibração espiritual. Seria correto ler “A Voz do Silêncio” e meditar sobre o que a obra diz. Você desenvolveu muito o lado intelectual. Deveria haver um desenvolvimento igual do lado devocional. O desejável é o despertar da consciência espiritual, da intuição – Buddhi – e isso não pode ser feito a menos que os pensamentos adotem esta direção com força e com propósito.
 
Você pode, se quiser, separar uma meia hora, logo antes de dormir e depois de levantar-se – tão cedo quanto possível, e antes de comer. Concentre sua mente nos Mestres como ideais e como fatos – como seres vivos, ativos, benéficos, que trabalham no plano das causas. Medite exclusivamente sobre isso, e tente chegar até Eles em pensamento. Se você vê que a mente se distraiu, traga-a de volta para o tema de meditação. A mente se distrairá mais ou menos, no início, e talvez durante um longo tempo no futuro, mas não desanime com os resultados aparentes, se eles forem insatisfatórios do seu ponto de vista. Os reais resultados não são imediatamente perceptíveis, mas o trabalho não é perdido, ainda que seja invisível. É mais do que provável que o trabalho nesta direção será percebido mais pelos outros do que por você mesmo. Não se preocupe com o passado, porque você está ingressando em algo que constitui um mundo novo para você como pessoa. Você colocou os seus pés no caminho que leva ao real conhecimento.
 
Não tente abrir contato consciente com seres em outros planos. Esta não é a época correta, e o perigo está à espreita neste caminho, devido ao poder que o estudante tem de criar suas próprias imagens, e por causa da força e da intenção das forças antievolutivas de simular seres de Luz, que podem inutilizar os seus esforços para alcançar a meta. 
 
Quando os materiais estiverem prontos o Arquiteto aparecerá, mas não busque por ele; busque apenas estar pronto. Faça o melhor que puder a cada dia, não tema coisa alguma, não alimente dúvidas, coloque toda sua confiança na Grande Lei, e tudo irá bem. Com a atitude correta, o conhecimento virá. 
 
Lamento que ocorram tantas coisas desagradáveis no começo. Posso entender muito bem tudo isso: calor, poeira, cansaço, em contraste com aquilo que se abandonou. É necessário ter coragem e resistência, e estas são qualidades desejáveis, assim como as qualidades que um Kshatria [1] deve ter. Isso, porém, não torna menos importante o discernimento: não é possível fazer tudo ao mesmo tempo.  
 
Mas, como nós todos desejamos uma luta que possa preparar-nos da melhor forma possível, podemos sorrir interiormente enquanto contemplamos os esforços da natureza para anular as nossas decisões. Todos nós temos as nossas batalhas, e se estamos neste exército podemos ter certeza de que o Eu Superior provocará tantas provações quantas forem necessárias para a nossa natureza peculiar. Penso que as coisas ficarão um pouco melhor depois de algum tempo – elas sempre ficam.
 
É a personalidade que não gosta de desconforto, mas ela se acostuma com as coisas depois de algum tempo. Assim, seja qual for a situação no futuro, é sábio lutar ao longo das mesmas linhas, como se esse fosse o trabalho das suas vidas. Quando a batalha estiver vencida, a necessidade cessará, porque o Eu Superior não desperdiça esforços. É fácil dar conselhos, e é mais difícil segui-los, mas é a prática que se necessita. Todas estas coisas devem constituir necessariamente testes e treinamento – pelo menos, eu penso que este é o modo correto de olhar para elas.
 
A analogia de “A Doutrina Secreta” mostra que cada mudança é precedida de uma rápida recapitulação de processos anteriores da evolução. Me parece que poderíamos usar isso em nossos próprios processos mentais e ser, possivelmente, capazes de compreender a nossa posição no ciclo. Poderíamos conseguir que só a mente passasse pelos processos preliminares, entrando em ação quando se chega ao ponto adequado, usando a busca do mais alto como uma motivação. Deveríamos buscar o mais alto desde novos níveis a cada momento. “Não é assim que se consegue subir montanhas?” 
 
À medida que nos elevamos, de vez em quando temos vislumbres do lugar de onde começamos; e, ainda que às vezes pareça que estamos descendo de novo, podemos perceber que, na média, nos elevamos. Assim, estando preparados para tais coisas, nós aproveitamos cada oportunidade para aumentar a subida e evitar precipícios – porque dizem que em tais questões as regiões montanhosas existem em grande número.
 
Lembre também de que há muitos restos não gastos de Carma passado – “depósitos mentais”, segundo Patañjali – que você evocou para incluir na sua contabilidade. Alguns deles já vieram e outros ainda virão. Tenha cuidado para não contrair novas dívidas, postergando assim o acerto final de contas. Você sabe das dificuldades, e deveria fortalecer a si mesmo para passar por elas. Ninguém pode fazer isso por você, como sabe.
 
Também é correto sentir que, em seu aparente isolamento, você não está sozinho. Este “sentimento” deveria ajudar você, e acho que ajuda. Mantenha-o por perto.
 
Sempre fraternalmente, R.C. 
 
NOTA:
 
[1] Kshatria: um guerreiro.
 
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A Carta acima foi traduzida da obra “The Friendly Philosopher”, de Robert Crosbie, Theosophy Co., Los Angeles, 1945, 415 pp., ver pp. 13 a 15. Uma parte dela foi publicada na edição de dezembro de 2009 de “O Teosofista”.
 
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Em setembro de 2016, depois de cuidadosa análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu formar a Loja Independente de Teosofistas, que tem como uma das suas prioridades a construção de um futuro melhor nas diversas dimensões da vida.
 
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